quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Estátua

O grito mudo ecoa no horizonte de cinzas, ainda se pode ouvi-lo, quando os olhos fecham e a boca seca.

Em som de escuro, os tambores retumbam ao longe, ocos e pesados, junto com os ritmos inebriantes do coração, seguindo o fluxo lento do sangue que aquecem as mãos. Fazendo-as secas abrirem os dedos devagar, quase quebrando. As dunas cinza escuro se cruzam com os estrondos de vento e as montanhas de prata manchada se derretem e se precipitam, jogando constelações no céu.

Os olhos não piscam, os arrepios no corpo tentam miseravelmente preencher os espaços vazios por dentro e os ouvidos buscam assimilar o som do coração com as tambores ocos de outrora. Dentro daquele ar não havia apenas poeira. Tentando engasgar a garganta, alguns sentimentos, medos e mentiras brincam de caçar os pequenos vagalumes que por ali tentam voar. Com os olhos vidrados e pernas cruzadas ele observa a oscilação da poesia funebre de seu subconsciente silencioso. Em busca de ar, seus lábios secos se abrem de vez em quanto. Respira. A sensação lhe queima a garganta e seu nariz treme. Seu rosto fecha. Em segundos aquele lugar se torna cada vez mais escuro, como o som que retumba da luz atras das montanhas. As calças negras se rasgam nas pontas a cada respirar fracassado. Engole seco. Da mais pequena brisa um arrepio na espinha, passando das costas para a ponta dos dedos. Seus olhos desviam para os braços, lhe fazendo perceber sua pele desidratada e as pequenas tatuagens vermelhas se tornarem vinho sangue, escuras, fugindo de si. Respira. Queimação. Fôlego. Fecha seus olhos. Se concentra e fecha suas mãos para sentir o calor. Mesmo com a sensação de rasgar, abre seus lábios secos e com a boca entre aberta puxa o ar. Seus olhos piscam. Seu corpo arrepia e ao redor sente um vento gelado e aconchegante. Os tambores seguem seu coração, lentos, ainda retumbam quase que vacilantes. As constelações se desmancham e as Luas se põem no horizonte que nunca amanhece.

Pequenas rochas vulcanicas por ali jazem. Das frases dormentes e cheias de Sol se brotam as estrelas que ainda se arriscam a brilhar. Em forma de estátua, seu corpo medita surdo, mudo e de olhos fechados, sentindo, entre os ventos que transformam poesias em vagalumes sem rumo, entre as cinzas frias e pesadas de um queimar antigo cuja memória se morreu nas ilusões e medos, os arrepios que anestesiam a alma, como um poema esquecido por um fazer sem sentido.