sexta-feira, 16 de maio de 2014

Porções de escuro e a chuva de sonhos

O céu parece mais claro olhando daqui, parece que acenderam luzes demais abaixo dele, iluminando mais do que devia. Mais do que devia.

Depois de alguns parágrafos, acho que se foi. As costas continuam doendo, a sensação ainda franzi o ceno e as vísceras ainda saem em minha tosse nervosa. Abri as janelas mais do que devia, o vento gelado entra sem medo e esfria, junto com o escuro, esta pequena sala. A luz morna, azul, da televisão ligada tem som e assim eu já não consigo mais ouvir o barulho da chuva. Vez ou outra eu arrisco meu olhar por entre as janelas em frente minha janela, por ali as pessoas estão vivendo, lendo, vendo televisão e respirando sem perceber. (Será que elas perceberam?) Os carros passam pela rua, refletindo por entre os espelhos na sala e salpicando luz nessas paredes escuras. Apesar do tom morno, tudo permanece escuro nessas entranhas que chamo de sala.

Por entre arrepios e supetões de respiração lentos demais, eu ainda me molho na chuva. Costas. Tosse. Supetões. Por enquanto não há mundo lá fora, apesar daqueles que escorrem pelas janelas, não há mundo lá fora. Ele resolveu se esconder inteiro por entre minhas entranhas. Quase se esvaindo, na chuva eu resolvi chora-lo, mais do que devia, mas chorei. As costas também doíam, mas eu não percebi, não fazia diferença. Fazia tanto sentido não perceber. Enquanto chorei o mundo, ele chorava junto de nós.

Nessas porções de choro e euforia histérica, se deixou chover demais. Deixou se chover aonde não devia, por onde não via. Deixou se, por entre as entranhas, os sonhos que depois que escorrem pelos olhos, vistos na mão molhada não parecem brilhar da mesma forma. Parece que acenderam luzes demais em cima deles, iluminando mais do devia. Mais do que simplesmente devia, mais do que se pode chorar.